quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

MÚSICA SELF SERVICE

Reclamações e lamúrias de nada adiantam. Reclamar que a juventude não está querendo saber do rock ou MPB é perda de tempo. A juventude de hoje é eclética. Vai frequentar as tribos que quiser, beber das fontes que quiser, sem intermediação de ninguém. É multiplataforma e não linear. A música de hoje não é mais "a la carte". É self-service. As pessoas podem escolher no imenso menu oferecido pelos youtubes e spoftys da vida. A turma do "antigamente é que era bom" vive dizendo que a turma de hoje não tem gosto. Que bobagem! Cada época tem suas músicas da moda. Quando o axé apareceu sensualizando tudo, muita gente torceu o nariz. Como pode uma música tão vulgar assim, com tantas bundas e peitos ocupando os espaços? O povo dizia: essa tal de axé não tem conteúdo, não tem poesia, só tem essa dança maliciosa e essas letras de baixo calão. Mas o povo caiu no swing e barbarizou geral. A turma do rock reclama, mas já houve um tempo em que juventude embarcou na onda do rock brasil, que era dançante, bom pras baladas da época e também tinha muito sexo e diversão. Houve uma primeira onda com Roberto Carlos e a jovem guarda. Depois veio o rock dos anos 80. As músicas dos titãs, paralamas e Legião tocavam nos bailes. O rock brasil foi muito popular.  Depois vieram o sertanejo, o pagode e mais recentemente o funk, gêneros ainda mais populares instantaneamente assimilados pela massa. Aí vem os puristas reclamar que das 100 músicas mais executadas no país 90 são sertanejas, 8 funks e duas são pop. E reclamam que a artista mais bem sucedida do país hoje é Anitta, que começou como funkeira, mas flerta com grandes artistas pop do planeta e transita em gêneros como reggaton, funk americano, zouk e claro, com o funk carioca. Seu clip recém lançado é um funk muito bem tramado sob o ponto de vista do marketing. Primeiro por que a ambientação é toda em cenários de periferia, uma realidade bem carioca, espelho das periferias do Brasil. 
Achei genial a jogada de celulite explícita no início do clipe. A auto estima da celuliteiras foi lá em cima. Isso vende. Quanto a música, nada demais. Na verdade, um lixo. Mas um lixinho rico. Nunca antes na história do país tivemos uma artista com tamanho apetite pop. Vai, malandra, para o topo das paradas... 
Sem falar no sucesso da cantora Pablo Vittar ( é muito engraçado chamá-lo de cantora, mas é assim que vem sendo tratada. Mas voltando ao assunto rock, há algum tempo publiquei que o estilo tinha ficado gagá,  caduca, uma músicapara velhos. O rock broxou. 

Do slogan "sexo, drogas e rock and roll" muito pouco sobrou. A galera que nova que faz rock parece que tem vergonha de ser pop e prefere falar de depressão e de política. Parece que encaretou. Nada de experiências sensoriais e de comportamento politicamente incorreto. Ficou tudo comportado, alternativo, pouco festivo. Por isso bandas como Rolling Stones, ACDC, Beatles continuam veneradas. Até pela turma mais nova, saudosa de um tempo que nem viveu. Com a MPB aconteceu algo semelhante. Foi o estilo preponderante principalmente durante a ditadura e no inicio da redemocratização do país. Mas a turma erigiu toda a sua obra naquela época e os que vieram depois não tiveram a mesma capacidade de popularização. Além do mais, é um gênero pouco interativo, feito pra fazer pensar, mas não pra dançar. É um estilo mais adequado para teatro e não para grandes bailes populares e shows ao ar livre. Aliás, talvez ai esteja o "ó do borogodó", o ponto de disrupção das fases anteriores da música e da vivenciada hoje: a interação. 
Num show sertanejo ou mesmo de funk, o público deixa de ser apenas platéia para se transformar em protagonista, dançando, participando e interagindo com os artistas. A atitude é outra. Bom, mas chega a hora de concluir o textão. Em alguns momentos fui  apocaliptico, falei da preocupação com a automatização e até sobre a inteligência artificial substituindo o músico. Mas...em 2018 vamos tentar ver o copo cheio. Que tal os artistas pararem de reclamar e dedicarem-se mais? Que tal mais profissionalismo, mais compromisso? Que tal shows roteirizados e ensaiados, com iluminação bacana, roupas adequadas, disposição pra divulgar nas mídias e finalmente gerar renda e qualidade de vida? Que tal as cigarras e formigas trabalhando juntas? Um respeitando o ofício do outro? Tomara que 2018 seja um ano de virada, em que consigamos re-significar a arte na vidas das pessoas.  E pra finalizar, agradeço a todos pela atenção ao longo do ano. Nas próximas edições retornaremos às entrevistas com artistas do Médio Piracicaba e repercutiremos os assuntos culturais da região. Felicidades para todos...

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

O FUTURO DA MÚSICA

Além de todos os problemas decorrentes da baixíssima curiosidade intelectual, da crescente alienação das massas, da quase eliminação da cultura da ordem do dia, da falta de interesse por conteúdos de relevância e de uma quase marginalização da arte, pelo seu viés questionador e reflexivo, temos um inimigo ainda mais poderoso. Assistimos a cada dia ao avanço das tecnologias, que substituem e tornam o homem obsoleto nos mais diversos setores.
O Jornalismo mudou radicalmente, assim como a publicidade. A advocacia vem sendo impactada, a medicina, a engenharia, a educação, tudo num processo de constante transformação e autofagia.
Os mais otimistas acham tudo maravilhoso e tratam de tirar o máximo das parafernálias da moda. Há quem diga que sempre foi assim, que a pólvora aposentou a espada, assim como a lâmpada aposentou a lamparina e por aí vai. O mercado de querosene caiu e os ferreiros que fabricavam espadas tiveram de mudar de ramo ou fabricar ferraduras.
Com relação à música, houve um tempo em que era tudo analógico, tudo no muque, sem metrônomo nem nada. Música humana, sem firulas.
Mas aí começaram a aparecer os teclados eletrônicos. Tivemos a oportunidade de acompanhar a evolução dos samplers, das baterias eletrônicas, dos teclados e pedais maravilhosos que turbinavam o som.
Depois vieram os softwares de edição, que nos permitiram transformar nossos computadores em "home studios" com relativa qualidade.
Só que até então o poder estava nas mãos do ser humano. O homem ainda era necessário para criar e programar os sons.
Mas aí chega uma notícia chocante: já existem computadores baseados na Inteligência Artificial que compõem músicas. São alimentados com conhecimentos quase infinitos, com sons de todos os tempos e timbres, com programação de algoritmos e sei lá mais o que criando, músicas para diversas finalidades.
É com isso que nós músicos e compositores humanos já estamos concorrendo. As máquinas já estão criando sinfonias funcionais e industriais. Músicas pra acordar, pra comer,  caminhar, malhar, transar, trabalhar, pra acelerar o trabalho, pra colheita no campo, cavalgadas, guerras, todas as ações e sentimentos humanos similares.
Essas músicas são executadas por programas que transformam a criação em sons utilizando samplers com todos os sons analógicos e sintéticos produzidos pelo homem.  
Atenção: não é ficção. É realidade! Quem quiser pode pesquisar na internet e conhecer algumas composições feitas por IA. Algumas não são muito diferentes das coleções de trilhas disponíveis por aí. Mas tem até jazz e composições clássicas com  qualidade relativa. 
Podemos até concorrer com os computadores ao oferecermos músicas orgânicas, puras, feitas em nossos cérebros cheios de imperfeições, verdadeiras quitandas.  Será como oferecer verduras e frutas orgânicas, sem agrotóxicos ou aditivos. 
Os pessimistas acham que com a IA a humanidade vai ficar obsoleta e pode até ser eliminada pela criatura. Os otimistas acham que a IA  vai ajudar a aprimorar a humanidade. Nós humanos  aprendemos com a natureza. As máquinas aprendem conosco.
Se terão lealdade ou piedade, só o tempo dirá.
Se der errado, vamos ver se alguém lembrou de criar um botão de on/off. 

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

APOCALIPSE CULTURAL


A tecnologia vem passando o rodo e mudando tudo na vida cotidiana e não seria diferente com a arte. A cultura como conhecíamos não existe mais. Virou outra coisa, desmaterializou-se, virou nuvem...

NOVILÍNGUA

Os novos tempos carregam um forte elogio à ignorância. A simplicidade tornou-se virtude hipervalorizada . As pessoas consomem mensagens a cada dia mais reduzidas. Muitos só lêem as fotos e legendas ( daí o sucesso do instagram). As pessoas passaram a ter preguiça de textos maiores, vídeos maiores, conteúdos densos. Há um certo enfastio da profundidade.

PIRATARIA SEM CONTROLE

Hoje em dia, com a facilidade de se copiar e colar qualquer coisa, como ganhar dinheiro? Se você compartilha, caiu na rede, não é seu mais. Temos templates de quase tudo e está só piorando.  Direitos autorais sobre fotos? Sobre música? Sobre textos? Esqueça! Se tiver dinheiro pra contratar advogados, vá em frente...



FIM DA MATERIALIDADE

De repente ficou tudo fluido, comprimido, evanescente. Quem consumia música há algumas décadas precisava de LPs, K7s, Mds, Cds, pendriveS. E hoje tá tudo na nuvem descomunal. Você paga um tikim e tem um tantão...quase um infinito de músicas e outros conteúdos.

TEM O LADO BOM

Tem quem defenda que os artistas nunca tiveram um meio tão democrático para atingir seus fãs. É só ter um canal no youtube, um facebook da hora, instagram com belas fotos e pá: tá resolvido.  Mas como conseguir audiência no meio de um barulho desses?

DÁ PRA GANHAR DINHEIRO COM MÚSICA?

Antes alguns artistas faturavam com direitos autorais. O ECAD arrecadava na execução em rádios e tvs, nos eventos, nos bares.  Havia a perversidade dos jabás. Hoje, nem isso tem mais. A internet vem mordendo o bolo das rádios continuamente e parece ser um caminho sem volta. Num cenário como este, poucos ganham com direitos autorais. A saída para os músicos é tocar ao vivo, vender shows. Mas como vender se a banda não for famosa?

DITADURA DO COVER

E pra completar o elenco de notícias cabulosas para a nova música, temos essa covermania. Os donos de bares não querem saber de artistas autorais, considerados chatos e alternativos. E dá-lhe bandas imitações tocando o set de alguma banda. E com isso, não há renovação. Nas artes práticas, as cópias ( artesanato) costumam dar mais lucro que os originais.

E COMO FICAM OS AUTORAIS?

Terão de cavar novos veios, procurar novos espaços de fruição e monetização do trabalho. Alguém vai querer pagar por originalidade. Por enquanto a situação está nebulosa. Mas tem gente por aí se dando bem. Tem gente ganhando dinheiro no spotfy, até mesmo no youtube.

SÓ O PROFISSIONALISMO PRA SALVAR...

Reclamar não adianta. Qualquer parceria precisa passar firmeza. Os artistas e seus empresários precisam se profissionalizar e somar no esforço de levar público, o que será bom pra quem contrata e para o contratado. Muitas bandas vão lá, levam um lero com o dono e esperam que as casas façam tudo e inclusive levem público.  E na hora do show, tocam como se estivessem nos ensaios, mal olham pra cara da platéia, não se comunicam, não oferecem uma experiência positiva. Muito pelo contrário: olham pro nada, não fazem questão de interagir, de causar algum impacto ou emoção. Alguns dizem que tocam pra agradar a eles mesmos. Bom, creio que para masturbação o palco não seja um espaço adequado.

A DIREITA NÃO TEM DISCURSO PARA A CULTURA

Eu vejo algumas pessoas xingando os artistas, que em sua maioria, nutrem simpatia pela esquerda. Isso é fácil de explicar.  Não se vê a direita abraçando nada em termos culturais. Nem a turma tucana. Enquanto isso, a esquerda abraça. Para a direita, a arte é um devaneio, coisa de cigarras num mundo de formigas.